sexta-feira, 28 de julho de 2017

Manifesto Pela Floresta Contra a Crise, 2011 (texto e os signatários)

Parque Natural Serra São Mamede

"O que tem faltado? (...) na pequenez da propriedade e no individualismo da nossa matriz cultural. Sem cortar este nó górdio e desenhar medidas que transformem a estrutura da propriedade, será impossível promover a eficiência económica dos dinheiros públicos e privados, cada vez mais escassos, e assegurar a competitividade das fileiras florestais.
Isto implica a necessidade de conduzir com urgência uma reestruturação fundiária sob o primado do interesse nacional, respeitando a propriedade privada.
Esta reestruturação fundiária é decisiva, uma vez que mais de 90% das terras florestais são detidas por privados. Assim, o tema decisivo e prioritário da política florestal é a capacidade de assegurar que a propriedade florestal seja adequadamente gerida."
(excerto do Manifesto Pela Floresta contra a Crise, 2011)

O manifesto “Pela Floresta contra a Crise”, apelando a uma “política fiscal coerente” para aproveitar o potencial económico, social e ambiental da floresta foi entregue em Setembro de 2011 no Ministério da Agricultura, Ambiente, Mar e Ordenamento do Território, tendo sido na altura amplamente publicado em diversos jornais.

Este manifesto sublinha que é preciso «reforçar o papel do associativismo» e «conceber uma política fiscal coerente que propicie uma reestruturação fundiária adequada».

Transcrevo de seguida o manifesto na íntegra:



O manifesto – Pela Floresta Contra a Crise

Para sair do ciclo vicioso da recessão, endividamento externo, empobrecimento e aumento do desemprego a sociedade portuguesa tem de crescer economicamente e valorizar o trabalho, consumir menos produtos importados, criar riqueza transaccionável com base nos recursos nacionais, transformar esse produtos e exportá-los para mercados que valorizem a qualidade. Vários estudos têm destacado o potencial dos recursos endógenos, como o turismo, o património cultural, o mar, os recursos geológicos, a agricultura e a floresta.

Em Portugal os espaços silvestres ocupam 64% do território dos quais mais de metade estão arborizados (38%). Esta riqueza que herdámos e que temos vindo a utilizar, com base na transformação e exportação dos seus produtos (12% das exportações nacionais), permite pagar o que importamos para nos alimentarmos; cria e mantém mais de 140.000 postos de trabalho directos, remunera muitos milhares de proprietários e contribui em 3% para o PIB nacional. A floresta é uma das nossas principais riquezas! Cria emprego e desenvolve o interior do país, qualifica e organiza a força de trabalho que fornece as fileiras industriais da cortiça, do papel, dos aglomerados, da serração e do mobiliário. Estas indústrias não são deslocalizáveis e exportam produtos com elevadíssima taxa de valor acrescentado nacional. O território florestal suporta uma parte da pecuária, produz caça e pesca, e é fonte de energia renovável, fixadora de carbono, promotora da melhoria do solo, é salvaguarda de biodiversidade, regula o regime hídrico e constitui paisagens para lazer, recreio e turismo. É um valor nacional avaliado em muitos milhares de milhões de euros. É também história, cultura, memória, silêncio, bem-estar e futuro.

Neste momento de crise, pode a floresta ajudar o País a reerguer-se, criando riqueza e emprego e contribuir para a prosperidade dos nossos filhos? Os signatários deste Manifesto defendem que Sim. Contudo, é imperioso que de forma persistente e consistente no espaço e no tempo, seja promovida e valorizada a gestão activa dos recursos florestais. A percepção do valor da floresta vem de longe e sublinha o facto de os principais grupos económicos portugueses terem a sua origem na floresta. Mas, nos últimos 30 anos as alterações sociais e as dinâmicas nos territórios florestais e rurais sucederam-se a um ritmo que ultrapassou a capacidade de gestão existente (conhecimento, pessoas, instituições). Somente parece ter havido capacidade de reagir aos problemas, atacando não as suas causas, mas os sintomas e as consequências. Por exemplo, sabendo que o problema dos incêndios só se resolve com a gestão profissional da floresta, o país tem reiteradamente insistido numa estratégia de combate ao fogo; o risco de incêndio agrava-se, há depleção do valor actual e da expectativa de rendimentos futuros dos territórios florestais.

O País, sendo pobre, não tem o direito de olhar de soslaio para a sua floresta, pondo em causa o seu futuro e a sua soberania.

A aprovação por unanimidade na Assembleia da República da Lei de Bases da Floresta constituiu um marco histórico. Pese, embora, este consenso alargado entre todas as forças políticas, as medidas, os instrumentos e os recursos financeiros sucessivamente disponibilizados não têm tido as necessárias consequências práticas, como se demonstra pela degradação da qualidade e quantidade do material lenhoso (revelado pelos inventários nacionais), o abandono dos espaços florestais (incluindo os públicos), os impactes dos incêndios e o descontrolo das pragas e doenças. Dos inúmeros e bem financiados planos e programas, quase todos têm demonstrado uma incapacidade crónica em concretizar as justas expectativas de um país com uma das mais altas produtividades florestais da Europa.

O que tem faltado? Na maior parte do território florestal, com excepção da agro-silvo-pastorícia do Sul, as iniciativas dispersam-se e fragmentam-se na pequenez da propriedade e no individualismo da nossa matriz cultural. Sem cortar este nó górdio e desenhar medidas que transformem a estrutura da propriedade, será impossível promover a eficiência económica dos dinheiros públicos e privados, cada vez mais escassos, e assegurar a competitividade das fileiras florestais.

Isto implica a necessidade de conduzir com urgência uma reestruturação fundiária sob o primado do interesse nacional, respeitando a propriedade privada. Esta reestruturação fundiária é decisiva, uma vez que mais de 90% das terras florestais são detidas por privados. Assim, o tema decisivo e prioritário da política florestal é a capacidade de assegurar que a propriedade florestal seja adequadamente gerida.

Tendo a floresta um papel estruturante, quer no plano territorial, quer económico, ambiental e social, a sua má gestão (ou ausência dela) é mais do que um desperdício: é uma irracionalidade civilizacional, que acrescenta risco a quem quer gerir bem, e obriga a comunidade nacional a despender somas brutais de recursos financeiros cada vez mais raros.

Neste manifesto defendemos a necessidade insubstituível de uma reforma fiscal inteligente e coerente que penalize essas situações e que estimule a gestão activa e profissional do recurso terra, premiando quem faz e quem assegura a perpetuidade das receitas. Focados na resolução das causas do problema, os estímulos devem visar a mobilização dos proprietários através do apoio técnico e profissional para gestão e venda agregada dos seus produtos (reforçando a via associativa), o desbloqueamento das ZIF (Zonas de Intervenção Florestal) e a disponibilização dos recursos do Fundo Florestal Permanente para alavancar financeiramente as iniciativas de gestão dos proprietários. A via fiscal deve estimular o mercado da terra (venda ou renda). De tudo isto resultará também a atracção do investimento e a constituição de poupança.

Em síntese, lança-se o repto à governância do País (Parlamento, Governo e Autarquias), para que se dedique, directamente pelo desenho das políticas públicas, e indirectamente pela indução das práticas de gestão e de engenharia, à resolução das causas profundas e estruturais que estão na base da degradação da floresta portuguesa. O Futuro de Portugal passa por aqui!


O texto Manifesto II - Outra Vez os Incêndios - In Expresso, caderno de Economia, pág 38, edição de 10/11/2012
Os signatários, por ordem alfabética (os nomes assinalados com ( * ) correspondem ao grupo dinamizador da iniciativa):

Alberto de Castro
Prof. Faculdade de Economia e Gestão/U.Católica Porto. Presidente AG Centro PINUS
Álvaro Amaro
Autarca. Antigo Secretário de Estado Agricultura e Deputado
Américo M. S. Carvalho Mendes
Prof. Faculdade de Economia e Gestão/U.Católica Porto. Presidente Direcção Ass. Florestal do Vale do Sousa
António Alberto Gonçalves FerreiraEngº Agrónomo. Empresário agrícola e produtor florestal
António Alberto Monteiro AlvesProf. Emérito do ISA. Antigo Vice-Reitor UTL.
António Loureiro (*)
Presidente UNIMADEIRAS.
Director da Assoc. Florestal Baixo Vouga e da ANEFA – Assoc. Nac. Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente
Armando CarvalhoEngº Florestal
Francisco Avillez
Prof. Emérito ISA. Coordenador científico da AGROGES
Francisco Carvalho GuerraProf. Catedrático Jubilado Universidade do Porto. Antigo Presidente C. R. Porto / Univ. Católica.
Presidente FORESTIS – Associação Florestal de Portugal
João Ferreira do Amaral
Prof. Catedrático do ISEG aposentado.
Presidente da Associação para a Competitividade da Indústria da Fileira Florestal – AIFF
João M. A. Soares ( * )
Antigo Director-Geral Florestas e Secretário Estado Florestas.
João Santos Pereira ( * )
Prof. Catedrático I.S. Agronomia. Membro CNADS
João Soveral
Engº Florestal. Antigo vice-presidente Instituto Florestal
Jorge Sampaio
Antigo Presidente da República
Lucílio Martins
Engº Florestal. Aposentado da DG Florestas
Luis Braga da Cruz
Engº Civil. Prof. Convidado da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
L. Valente de Oliveira
Prof. Aposentado U.Porto. Antigo Presidente CCRNorte.
Antigo Ministro Educação e das Obras P. e Planeamento e Admin. Território
Luisa Schmidt
Profª ICS/Univ. Lisboa. Membro CNADS
Maria do Loreto Monteiro
Profª Coordenadora aposentada.
Presidente da Sociedade Portuguesa Ciências Florestais
Pedro Bingre
Prof. Instituto Politécnico de Coimbra
Tiago Oliveira ( * )Mestre em Gestão Recursos Naturais
Victor Louro ( * )Engº Florestal. Aposentado da DG Florestas.
Antigo Secretário de Estado Estruturação Agrária e Deputado

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