quarta-feira, 8 de dezembro de 2004

A medida acertada

Governo chumbou municipalização das reservas agrícola e ecológica nacionais
ANA FERNANDES 08/12/2004

A proposta apresentada pelo arquitecto paisagista Sidónio Pardal para um novo regime jurídico da Reserva Ecológica Nacional (REN) e da Reserva Agrícola Nacional (RAN) foi chumbada pelo Ministério do Ambiente. O ministro Luís Nobre Guedes afastou a hipótese de municipalização destes instrumentos e decidiu que outra equipa fará uma nova proposta.O estudo feito por uma equipa do Instituto Superior de Agronomia liderada por Sidónio Pardal, concluído em Abril deste ano, gerou diversas críticas, embora agradasse aos autarcas. Tudo porque se defendia que estes instrumentos do ordenamento do território deviam ficar sob a alçada do município, perdendo-se assim o seu carácter nacional (ver texto nesta página). 

O ministro do Ambiente, depois de recolher diversas opiniões, entre as quais a do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável e da Comissão Nacional da REN, decidiu que a proposta não iria vingar. E aponta diversas razões: "Em primeiro lugar, não posso concordar com o facto de as reservas ecológica e agrícola perderem o seu âmbito nacional", lê-se no despacho a que o PÚBLICO teve acesso.Além disso, o ministro discorda do pressuposto de Pardal de que terão sido a REN e a RAN os responsáveis pelo desordenamento que grassa em Portugal. 

Entre outros pontos, Nobre Guedes salienta ainda o seu desacordo face à ideia "de que dentro do perímetro urbano não possam existir espaços naturais, espaços agrícolas, RAN e REN"."Não adiro à tese segundo a qual as restrições e servidões por utilidade pública tais como a REN, porquanto reduzem o conteúdo do direito de propriedade do solo de forma tão grave e intensa que podem ser consideradas como tendo um carácter expropriativo, devem estar sujeitas a indemnização", esclarece ainda o ministro.Estudo compatívelcom quadro jurídico

Com base nas críticas que faz ao trabalho de Sidónio Pardal, Luís Nobre Guedes afirma-se convicto de que "o regime da REN visa assegurar a protecção de ecossistemas e a permanência e intensificação dos processos biológicos indispensáveis ao enquadramento equilibrado das actividades humanas, constituindo uma estrutura biofísica básica do território".Por outro lado, "a RAN tem como principal objectivo garantir que os solos de maior aptidão agrícola possam ser efectivamente afectos à agricultura" e os dois regimes "devem continuar a ser encarados como regimes legais de âmbito nacional que prescrevem limitações à liberdade de modelação ou de conformação do conteúdos dos instrumentos de gestão territorial, estabelecendo para alguns tipos de bens imóveis um regime jurídico particular", acrescenta o governante. Face a estes pressupostos, Nobre Guedes determina que se faça uma ponderação, não só do estudo de Sidónio Pardal, mas também dos vários pareceres emitidos sobre este, assim como do trabalho feito em 1997 pela Comissão Nacional da REN e dos contributos de associações não governamentais, administração pública e algumas personalidades, "de forma a que venha a ser preparada uma proposta legislativa de grande consenso, num contexto de processo participado." 

Este novo estudo, ao contrário do que era criticado no que foi apresentado por Sidónio Pardal, deve ser compatível com o quadro jurídico existente. A nova proposta deve apostar na "valorização daquelas áreas, considerando, por um lado, a natureza de restrição de utilidade pública e a coerência e a lógica dos objectivos nacionais que neste domínio incumbem ao Estado, por força da Constituição, e, por outro, a necessária agilização e a fixação de usos compatíveis com tais restrições de utilidade pública", aponta ainda o ministro.A constituição da equipa encarregue de elaborar este novo documento ainda não foi divulgada


Quercus congratula-se com decisão do Ministério do Ambiente



Reservas Ecológica e Agrícola merecem estudo independente 

De acordo com as notícias hoje vindas a público, este estudo, que mais parece um extenso artigo de opinião, não irá ser considerado na revisão da REN e da RAN, estando a ser preparada uma nova equipa para proceder à realização de um estudo independente.

A Quercus não entende como é que o Governo foi capaz de encomendar ao mais feroz crítico da REN, o Prof. Sidónio Pardal, um estudo sobre esta matéria, o que obviamente não augurava uma análise independente da aplicação e futuro deste instrumento de ordenamento do território.

O estudo desenvolvido pelo ISA apresenta propostas que entram em contradição com os objectivos de reforçar a eficácia dos instrumentos de salvaguarda dos recursos naturais, enunciados pelo governo. Este "estudo" é de uma qualidade técnica e científica abaixo de um nível mínimo aceitável, sem estrutura compreensível em função dos objectivos que a ele presidem, contendo erros factuais e afirmações não fundamentadas.

A QUERCUS defende uma revisão do actual regime da REN e da RAN que reforce a eficácia destes instrumentos de planeamento e uma maior integração das figuras de protecção dos valores naturais, fazendo preceder estas revisões de estudos técnicos idóneos que avaliem os sucessos e insucessos dos regimes de protecção em vigor.

No entender da Quercus, o novo estudo que agora será necessário desenvolver deverá fazer uma avaliação detalhada, tendo por base alguns concelhos, sobre os critérios de classificação da REN e da RAN, e particularmente em relação à primeira, da relação entre a necessidade de protecção dos valores em causa e as limitações impostas. Um estudo sobre a revisão destes instrumentos implica simular o futuro destes instrumentos, num quadro que não deve de forma alguma desresponsabilizar a administração regional e central da sua aplicação.

É fundamental a definição e implementação de um modelo de discussão pública alargada que permita o envolvimento de toda a sociedade de modo a que o novo regime da REN e da RAN, que venha a resultar deste processo de revisão, seja adoptado por todos os cidadãos como instrumentos fundamentais no ordenamento do território e na preservação dos equilíbrios e valores naturais.

Lisboa, 8 de Dezembro de 2004

A Direcção Nacional da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza
Lisboa, 8 de Dezembro de 2004
A Direcção Nacional da Quercus- Associação Nacional de Conservação da
Natureza

Para mais esclarecimentos contactar Hélder Spínola, Presidente da Direcção
Nacional da QUERCUS, 937788472 ou 964344202.


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